domingo, 26 de dezembro de 2010

Hmmm, hmmmm.

Continuo a pensar na frase de um amigo meu que dizia que o desencontro vai ser a principal causa de morte neste século. Tenho-a repetido. Trocado. Dado. É importante que a ouçam ou que a leiam antes de serem apanhados pela ausência.
Este texto é capaz de saber a bacalhau cozido no Dia de Natal. Ora o Dia de Natal é dia de carnes tostadas, não do fiel bacalhau. Este desconsolo que momentaneamente vos trago é quase como aquele sádico «o que arde cura». Sim, este texto, que pode ser dorido, também pode servir para nos fazer ir ao encontro. Ir ao encontro «é uma canseira», pensa o trintão com a comida pronta no braço do sofá. Ir ao encontro «para me desiludir de novo?», pergunta a divorciada, entupida em séries de TV que nunca foram reais. As pessoas não vão nem pelos seus dedos nem pelos seus meios. As pessoas ficam sozinhas para não se chatearem ( mirrando devagarinho ).
Se este texto for a espinha do bacalhau que não se queria, então vamos usá-la para prender um post algures. Usem esta espinha para se lembrarem de ir à vida que o norte é certo ( prefiro esta versão ).
Vem aí o início de um novo ano, aquela altura em que nos iludimos durante dias, para depois levarmos 11 meses de negação. Esperem, estou a ser injusta: ali junto a Julho/Agosto a ilusão volta com o tempo livre das férias e a nação valente a pensar que tem de mudar... mas normalmente são assuntos de cartão de crédito ou ginásio. Pouco mais há de importante na cabeça de todos nós.
Vamos ao desencontro, essa praga silenciosa que nos exterminará lentamente mas ainda assim sem que nenhum cientista revele a tempo o antídoto eficaz. A haver uma descoberta, isso quereria dizer que todos nos tínhamos rendido ao amor e, como sabemos, isso é impossível. O amor só existe nos outros. Para os outros. O amor é uma espécie de doença que já não estamos à espera de que venha ter connosco. E dizemos que sim, que sonhamos com isso, que tudo o que queríamos na vida era amar e ser amados, mas no fundo, tretas. Entre abandonar o prato meio cheio no braço do sofá e ir ouvir as queixas de uma alma sofrida, mais vale a pele do sofá.
O que acontecerá a uma civilização que deixe de amar? Porque para procriar ( como sabemos e como tantas vezes foi acontecendo ) não é preciso amar. Só ter a intenção e ser bem sucedido. No amor também precisamos de ambos, mas o amor é algo maior do que nós. É uma espécie de dom que usamos mal ( ou não usamos de todo ). Uma civilização que deixe de amar tornar-se-á apática? Deixará de ter filmes e livros e canções bonitas? Rejeitaremos os abraços ou nem sequer reconheceremos um?
Enquanto faço ficção científica penso como o amor é uma linguagem que nos deu identidade. Porque há quem viva sem ele, mas esses diluem-se na mancha grande. São pouco notados na sua indiferença. A indiferença vem de não se querer o amor. Porque os que estão sozinhos à força ainda têm braços que agarram - mesmo que já não se lembrem da última vez...
Agora que as carnes tostadas vos acamaram o estômago ( depois do fiel amigo ), antes de pensarem que têm de emagrecer ou mudar a cor do cabelo, antes de pensarem em carro novo ou na próxima viagem low cost, pensem no desencontro. Pensem que 2011, mesmo sendo um ano ímpar, merece um par. O vosso. E que esse rabo ( neste momento ainda maior ) merece um encosto diferente do sofá. Ponham-se finos. Saiam de casa, estendam os braços e promovam o encontro. Há-de calhar-vos por vezes a senhora da Bimby, ou da Tupperware, o senhor do Círculo de Leitores ou o homem que conta a luz. ( E quem vos diz se não estará aqui o par das vossas vidas? )
Um braço estendido em 2011 vai trazer-vos o amor ou uma boleia. Em qualquer dos casos podem ser felizes.
Encontrem-se.
O Sexo e a Cidália, JN

4 comentários:

  1. Pode parecer estúpido, mas este texto pôs-me com lágrimas nos olhos.
    Gosto muito dos textos da Cidália e este tocou cá dentro. Num ponto muito sensível.

    Cat

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  2. Saber receber os outros, partilhar, ser amigo... é um bem precioso.

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